Durante muito tempo, expressar emoções foi interpretado como sinal de fraqueza. Chorar, então, era quase um tabu, especialmente para meninos.
Pais e mães, muitas vezes com boas intenções e movidos pelo desejo de formar filhos “fortes”, repetiam a frase que marcou uma geração: “engole o choro.”
Mas o que acontece quando uma criança aprende desde cedo que suas emoções não são bem-vindas?
Do ponto de vista psicológico, esse tipo de repressão emocional pode gerar uma desconexão profunda com o próprio mundo interno.
A criança cresce acreditando que sentir, especialmente tristeza, medo ou frustração — é errado ou vergonhoso.
Com o tempo, ela vai moldando sua forma de estar no mundo: escondendo emoções, tentando ser sempre “forte”, evitando a vulnerabilidade.
Na vida adulta, isso pode se traduzir em diversas dificuldades:
• Problemas para reconhecer e nomear o que sente;
• Dificuldade de pedir ajuda ou demonstrar fragilidade;
• Transtornos de ansiedade ou depressão mascarados por um aparente “controle”;
• Relações superficiais ou marcadas por afastamento emocional;
• Raiva reprimida, que muitas vezes explode de forma desproporcional.
Engolir o choro é, na prática, engolir também uma parte da própria humanidade. Crescer com essa mensagem pode fazer com que o adulto se sinta constantemente desconectado de si e dos outros — mesmo sem entender exatamente o porquê.
Segundo a Terapia do Esquema, experiências repetidas de invalidação emocional na infância podem contribuir para o desenvolvimento de comportamentos disfuncionais, como inibição emocional — quando o indivíduo aprende a reprimir sentimentos para evitar julgamento, punição ou rejeição.
Estudos em neurociência também mostram que o choro, longe de ser um sinal de fraqueza, tem função reguladora do sistema nervoso. Ao impedir que a criança chore, bloqueamos uma forma natural de descarregar a tensão e organizar o mundo interno.
Como psicóloga, vejo diariamente os efeitos dessa cultura emocionalmente negligente. A boa notícia é que nunca é tarde para reaprender a se conectar com suas emoções. Permitir-se sentir, expressar e até chorar, é um ato de coragem e um caminho de reconexão consigo mesmo.
A escuta empática, o acolhimento e o espaço terapêutico seguro são essenciais para resgatar essa dimensão perdida da infância: o direito de sentir sem culpa ou medo.
A geração do “engole o choro” pode sim se transformar — basta começar por reconhecer que sentir não é fraqueza, é potência.