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MEUS TEMPOS DE CORONEL PRAXEDES

Poleiro do Chantecler – Coisas da vida

De vez em quando vejo no meu whatsapp fotos da Bom Despacho antiga, no tal “Bar do Tonhão”. Gostoso de ver. Outro dia mesmo vi uma foto antiga do Grupo Escolar Coronel Praxedes (acho que, hoje, o nome é outro). Construído em 1900 e antigamente, o Praxedes sempre foi um conjunto arquitetônico destaque de nossa Bom Despacho. Fiquei olhando pra aquela foto e voltei no tempo, como sempre acontece quando vejo algo que marcou os anos de minha infância.

Me lembro até hoje do teste que tive de fazer pra entrar pro Praxedes e ver a turma em que eu iria ficar. Eu tinha acabado de completar meus 7 anos. Naquele tempo não havia pré-primário, muito menos maternal. Creche nem pensar. Havia só o “primário” – que durava 4 anos -, depois o “admissão” de um ano e, após isso, a gente fazia uma prova pra entrar pro Ginásio Miguel Gontijo. Naquela época, em Bom Despacho, o ensino parava aí.

Voltando à minha entrada no Praxedes, havia vários meninos e meninas para fazer o teste, todos acompanhados ou da mãe ou do pai. O teste era oral e individual. Chegada a minha vez, a professora (D. Solange) me mostrou um figura com um homem montado num cavalo e me perguntou o que havia de errado na figura. Fiquei olhando, olhando e não via nada de errado. Olhei pra minha mãe como que a pedir ajuda e ela me disse: “-O erro é muito claro. Olhe direito pro homem!” A professora a repreendeu: “-Não pode soprar pra ele, não!” Olhei de novo fixamente pra figura. De repente, me deu um estalo e eu disse: “-A cabeça do cavalo tá no lugar errado!” A professora riu e me disse: “-Não, a cabeça do cavalo está no lugar certo. O homem é que está montado virado para o rabo!” E eu disse: “-Era isso que eu queria dizer!” “-Queria mas não disse!” – respondeu a D. Solange. Me aplicou outros testes que achei mais fáceis e acho que ela gostou de mim, pois me colocou na turma dela – a Turma A – que era para os alunos que melhor passavam no teste.

Cursei prazerosamente o Praxedes por 4 anos. Adorava aqueles varandões internos que davam acesso às salas de aula. As salas eram de assoalho. As carteiras eram para dois alunos, menino com menino e menina com menina. No 2º ano, minha professora foi a D. Sassã – mãe do Robinson – aquele que, mais tarde, trouxe o SESC para Bom Despacho. E quando ia passar para o 3º ano, apanhei uma pneumonia braba que me impediu de fazer as provas finais. Tive de repetir de ano. Quando voltei, me puseram na Turma B, porque na Turma A só ficavam os alunos que nunca tinham repetido de ano. Fui para a sala da D. Eulina com quem fiz o 3º e o 4º ano. Magra e esbelta, D. Eulina era a professora mais elegante do Praxedes. Foi amor à primeira vista. Eu era um excelente aluno, modéstia às favas. Só tirava 9,0 e 10,0 (na verdade, a única coisa que eu soube fazer razoavelmente bem na vida foi estudar). Na minha sala havia uma menina moreninha – a Lurdinha – que também era ótima aluna. Eu a odiava quando ela tirava nota maior que a minha.

Teve até um episódio que marcou minha convivência com a D. Eulina. Um dia, na passagem do 3º para o 4º ano, ela me chamou após a aula e me disse que, na reunião da Diretoria, as professoras estavam avaliando o desempenho dos alunos e alguém comentou que eu era o aluno mais inteligente que já passara pelo Praxedes. Segundo ela, era uma opinião unânime entre as professoras. Por isso, elas queriam que eu fosse transferido para a Turma A – a dos melhores alunos. Ela me disse que gostaria de continuar comigo na turma dela, mas que a decisão era minha. E eu respondi na bucha: “-Vou continuar na turma da senhora!” Ela me deu um abraço e chorou. Eu também. Isso mudou minha vida. Passei a estudar cada vez mais para confirmar a opinião das professoras.

A vida no Praxedes era muito boa. Bom mesmo era a merenda fornecida de graça um pouco antes da hora do recreio. Ou era sopa ou era mingau. O melhor era na 6ª. feira, quando era servida canjica. Eu adorava.

Eu com 10 anos, tinha uma quedinha por uma menina de nome Isabelinha, da Turma A. Queria me aproximar dela mas isso só podia ser na hora do recreio. Mas, justamente no dia em que eu pensei em criar coragem e abordá-la, a D. Judith – a diretora que era o terror de todos nós – decidiu que, devido às muitas brigas dos meninos, o recreio das meninas seria no pátio de baixo e o dos meninos no pátio de cima. Nunca tive tanto ódio da D. Judith como naquele dia. Impedido de falar com a Isabelinha, eu ficava no parapeito que dividia os dois recreios olhando para ela o tempo todo. De tanto eu olhar pra ela, ela começou a olhar pra mim, também. Chegou até a sorrir e abanar a mão pra mim algumas vezes. Mas, não passou disso. Ah, Isabelina, meu primeiro amor! Por onde anda e para onde foi eu nunca soube. Deve estar casada, com filhos e com netos. Só ficou na saudade.

Um outro fato marcante na minha vida nos tempos do Praxedes: Na véspera do 7 de setembro – Dia da Independência – sempre havia uma solenidade na escola. O palco era o “platô” que unia as duas escadas laterais que desciam para o pátio das meninas. Ali alguns alunos cantavam, outros dançavam, outros liam algum texto de algum escritor famoso. Os demais alunos – a plateia – ficavam em pé, embaixo. Uma semana antes, a D. Eulina me chamou e me deu uma poesia de Luiz Guimarães intitulada “VELUDO” e me disse: “-Decore essa poesia pra você declamar no Dia da Independência!” A poesia era grande, mas aceitei a empreitada. Fiquei uma semana decorando a poesia e recitando em voz alta no quintal lá de casa.

Finalmente, chegou o dia e a hora. O pátio do Praxedes estava lotado de alunos, professoras e pais de alunos. De repente, a professora mestre de cerimônias anunciou no alto falante: “-E agora, para declamar uma poesia, eu convido o aluno Mozart Foschetti, do 3º ano da D. Eulina”. Subi as escadas um pouco trêmulo, mas confiante. Sabia a poesia de cor e salteado. Ajeitei o microfone para a minha altura e comecei:

“-Eu tive um cão. Chamava-se Veludo…” E de repente, me deu um branco e eu esqueci o resto da poesia. Tinha uma professora que ficava perto do microfone e que era chamada de “Ponto”. O papel dela era dar continuidade à declamação quando o aluno esquecia, como foi o meu caso. Quando me deu o branco, ela ficou falando: “..chamava-se Veludo!” e eu dizia: “-Eu já disse isso!” Eu queria que ela me dissesse a frase seguinte. Mas, ela repetia: “-Chamava-se Veludo…”. Repetiu umas três vezes. ”-Mas que mulher burra, gente!” – eu gritei e larguei às pressas o palco. Alguns alunos batiam palmas, outros riam às gargalhadas e outros vaiavam. Chorei copiosamente. Foi meu primeiro fracasso em público.

Tenho muitas outras lembranças do Praxedes, mas ficam para uma outra vez.

C

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Mozart Foschete

Poleiro do Chantecler – O ferrinho do dentista.

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